Em 2025, o Brasil assumiu uma posição central no debate internacional sobre clima e comércio. A criação de um Fórum Brasileiro de Clima e Comércio, em preparação para a COP30, que será sediada em Belém, marca um passo relevante na tentativa de alinhar a pauta ambiental com os fluxos globais de comércio e investimentos.
A discussão não é apenas política ou diplomática: ela afeta diretamente setores estratégicos da economia brasileira, como agronegócio, mineração e energia. Para os assessores de investimento, compreender as dinâmicas desse movimento é essencial para orientar clientes em um cenário em que política ambiental, fluxo de capitais e gestão de risco se entrelaçam de forma inédita.
Neste artigo, exploramos os principais pontos desse debate e como o assessor pode transformar o tema em estratégias práticas de comunicação e posicionamento de portfólio.
1. O contexto atual: clima como variável econômica
Historicamente, a questão climática foi tratada como um tema ambiental, muitas vezes desconectado das análises de risco econômico. Esse cenário mudou. Hoje, clima e comércio estão no mesmo tabuleiro geopolítico.
- União Europeia: implementou o CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism), mecanismo que taxa produtos de países que não adotam padrões ambientais equivalentes. Exportadores brasileiros de aço, alumínio e fertilizantes já estão no radar.
- EUA: embora sem uma política unificada, grandes fundos e investidores institucionais pressionam por práticas ESG, afetando empresas que não se adequam.
- China: principal parceiro comercial do Brasil, também começa a exigir certificações ambientais, principalmente para soja e carne.
Com esse pano de fundo, o Fórum Brasileiro surge como tentativa de posicionar o Brasil como player ativo: não apenas respondendo a barreiras, mas ajudando a moldar regras.
2. Impactos imediatos para a economia brasileira
2.1 Agronegócio sob pressão
O agronegócio, responsável por quase 25% do PIB, está no centro da questão. Commodities como soja, carne e milho podem enfrentar:
- Exigências de rastreabilidade: comprovação de origem livre de desmatamento ilegal.
- Custos adicionais de compliance: necessidade de certificações e auditorias.
- Risco reputacional: boicotes e restrições em mercados premium.
2.2 Mineração e siderurgia
Setores de alto consumo energético e emissões intensas, como mineração e siderurgia, também podem ser afetados:
- Maior pressão regulatória para reduzir a pegada de carbono.
- Potencial aumento de custos em energia limpa.
- Competição global por financiamento verde (green bonds, sustainability-linked loans).
2.3 Energia e infraestrutura
Se por um lado há custos, por outro há oportunidades:
- O Brasil, com matriz elétrica 80% renovável, pode se beneficiar da transição energética.
- Projetos em solar, eólica e hidrogênio verde ganham tração.
- Investidores globais já buscam veículos que financiem essa agenda.
3. Clima e fluxo de capitais: o olhar dos investidores globais
3.1 ESG não é mais nicho
Segundo relatório da Morningstar, fundos ESG já representam mais de 20% dos ativos sob gestão globalmente. No Brasil, embora ainda incipiente, gestoras como XP Asset, BTG e Itaú já estruturam produtos focados em sustentabilidade.
3.2 Risco regulatório como fator de precificação
Agências de rating e investidores institucionais passaram a considerar exposição a riscos climáticos como parte das métricas de análise de crédito e valuation. Uma empresa mal posicionada pode ver seu custo de capital aumentar.
3.3 Oportunidade em ativos verdes
O volume de emissões de green bonds e sustainability-linked bonds na América Latina cresceu mais de 40% em 2024, segundo a Moody’s. O Brasil responde por parte significativa desse mercado, especialmente em energia renovável e infraestrutura sustentável.
4. Indicadores que o assessor deve monitorar
Para transformar o tema em estratégia prática, o assessor precisa acompanhar:
- Preço das commodities agrícolas e minerais em função de barreiras ambientais.
- Taxa de câmbio, sensível a choques reputacionais e comerciais.
- Fluxos de fundos ESG no Brasil e no mundo.
- Políticas fiscais e regulatórias ligadas à transição energética.
- Agências de rating e seus relatórios sobre risco climático.
5. Como posicionar o portfólio do cliente
5.1 Diversificação setorial
- Reduzir concentração em setores mais expostos a barreiras ambientais (agronegócio e siderurgia).
- Aumentar exposição em setores beneficiados pela transição (energia renovável, tecnologia limpa, saneamento).
5.2 Alocação internacional
- Utilizar ETFs ESG globais e BDRs de empresas verdes como proteção e diversificação.
- Exposição a moedas fortes como hedge em cenários de tensão comercial.
5.3 Renda fixa verde
- Incluir green bonds ou debêntures incentivadas em infraestrutura sustentável.
- Observar emissões sustainability-linked com metas ambientais atreladas à remuneração.
5.4 Proteção contra volatilidade
- No curto prazo, reforçar posições em ativos pós-fixados (CDI, Tesouro Selic).
- Avaliar derivativos de proteção cambial para carteiras mais expostas.
6. Comunicação com o cliente: o papel do assessor
Mais do que ajustar carteiras, o assessor precisa traduzir o tema com clareza. Algumas recomendações:
- Didatismo: “O Fórum e a COP30 trazem novas regras de comércio ligadas ao clima. Isso pode aumentar custos para algumas empresas e abrir oportunidades para outras.”
- Cenários hipotéticos: simular o impacto de uma tarifa de carbono na soja ou de um subsídio em energia renovável.
- Frequência de contato: atualizações semestrais ou trimestrais sobre clima e comércio reforçam o papel consultivo.
- Confiança: mostrar que o portfólio já considera riscos climáticos transmite segurança em meio a um debate global.
7. Oportunidades além do óbvio
- Infraestrutura verde: concessões em saneamento, energia solar distribuída e mobilidade elétrica.
- Tecnologia agrícola: startups e empresas que desenvolvem soluções para reduzir impacto ambiental (bioinsumos, rastreabilidade digital).
- Mercado voluntário de carbono: empresas brasileiras começam a negociar créditos de carbono, criando novas teses de investimento.
Fórum Brasileiro de Clima e Comércio
O Fórum Brasileiro de Clima e Comércio insere o país em um debate global que não é mais opcional. Para o assessor de investimentos, esse movimento significa duas coisas:
- Gestão de risco – identificar setores e ativos mais vulneráveis a barreiras ambientais e ajustar a exposição do cliente.
- Exploração de oportunidades – aproveitar a transição para ativos sustentáveis, que atraem capital global e podem gerar retornos consistentes.
Traduzir o impacto de temas aparentemente distantes, como clima e comércio internacional, para a realidade da carteira do investidor é o que diferencia um assessor consultivo de um executor mecânico. Em um mundo cada vez mais interconectado, essa capacidade de leitura ampla é o que fortalece o papel do assessor como bússola estratégica para seus clientes.